quinta-feira, 24 de julho de 2014

No caminho para o descontrolo

Às vezes, pequenas coisas fazem-me pensar em grandes coisas. Nunca fui uma pessoa de me descontrolar. Não grito, não berro, não puxo cabelos nem atiro com coisas. Nas lágrimas também sou assim. Choro muito. Choro com pouco. Mas, choro compulsivo, que tira o ar, que nos atira para o chão... Não. Choro em silêncio, na almofada, escondida por um abraço, por detrás da minha franja, a olhar para o lado. Fingindo que não é nada. "Está quase quase a passar". Choro muito, repito. Por tudo e por nada mas, choro assim, quase sem incomodar. Pensava nisto, de chorar, porque já me notaram. Já me disseram o quão controlada sou. Lembro-me de cerrar o maxilar e fazer força. Muita força e dizer em silêncio "aguenta". E aguentei. Com lágrimas tímidas, gestos discretos. Penso nisto agora que, numa pequena amostra, me repetia. Foi uma noite de choro, num meio de um drama do cinema. Mas um drama mesmo. Com doença triste, com morte devastadora, com desespero. Comecei a chorar passado uns breves minutos. Por lembranças recentes, por histórias comuns, por uma beleza inevitável. Comecei por colocar as mãos na cara, com os dedos indicadores a suportar os rios que já corriam. Quando a água salgada derrubou a estratégia, recorri aos maxilares cerrados. Continuei a chorar desconfortável com o descontrolo. Até que comecei a rir. Sim, a rir. Os olhos estavam inundados e ao meu lado... Ela estava no mesmo padrão compulsivo. Chorávamos as duas piedosamente. Todo o cinema chorava. Tentou falar comigo e não aguentei. Começámos, num outro extremo a rir. Sem parar. No meio de um sentido choro. O choro que cada uma de nós sente que ainda tem de fazer. Mesmo que acompanhados por alguns, igualmente sentidos, risos.
Ontem li num livro "mesmo que possa parecer a mesma coisa, há uma enorme diferença entre existir e viver". Viver é isto.

4 comentários:

  1. Escreves tão bem...CLAP, CLAP CLAP.....

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  2. Gostei muito. Tens que te descontrolar mais vezes, faz bem :)

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  3. A rir ou a chorar, é preciso por cá para fora o que nos vai na alma. Também eu controlo demais...

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