sábado, 14 de fevereiro de 2015

Aviso: este é um post chato sobre corrida

Quando decido que é dia de treino, não pode ser dia de mais nada. Ponho os quilometros na cabeça e, enquanto não calço os ténis, não penso em outra coisa. Planeio tudo ao mais ínfimo pormenor. Cálculo a distância ao minuto, conto o tempo que demorarei até ao local e mesmo os descontos para estacionar e chegar depois a casa. No outro dia saí mais cedo do trabalho-coisa rara. Não pensei em ir às compras, nem deitar-me no sofá. Sabia que tinha de começar a correr às 5 para ir buscar os miúdos à hora certa. Sabia que correria mais devagar no início e teria de acelerar no fim. Custa-me sempre o início. Sempre. O primeiro quilometro não é nada. Tudo bem. Entre o segundo e o quarto, parece que não sou capaz. É nesta altura - sempre - que duvido de mim. Curvo mais o corpo e arrasto-me pelo esfalto. Sinto vergonha por me estar a custar. Já passaram uns bons anos desde que me iniciei. Aparecem os demónios da minha cabeça e o esforço é sobretudo mental. Numa luta comigo própria, falo em silêncio. Falta-me o ar e penso- não me doem as pernas, não sinto nada e, no entanto, parece que quero parar. Ana, está tudo bem. És forte. Que orgulho. Pensa! Não tens nenhuma dor. Tu consegues, vou repetindo.  E não páro nunca. Ponho os braços para baixo, abro e fecho as mãos, e continuo. Um pé em frente do outro. Nesta ultima vez estava sozinha. Fui pelo meu jamor, passei a ponte e fiz o novo passeio. Muito próximo do rio com uma luz sem descrição. Estava cansada e, no entanto, feliz. Passei por Algés, olhei para os lados, cumprimentei algumas pessoas. [é das coisas que mais gosto] Segui um rapaz de bicicleta e fui por detrás de um viaduto. O chão era de terra e o corredor de graffitis. Estava completamente só. Não tive medo. Não me lembrei do nome daquele monumento. Fiz quase um quilômetro a pensar nisso. Cheguei à Torre de Belém e depois ao Padrão dos Descobrimentos. A música nos meus ouvidos, os olhos na ponte. Dei a volta e acelerei. Voltar é sempre mais fácil. Os pensamentos são sempre outros. Atropelam-se as dúvidas para o jantar, as hipóteses para a roupa do dia seguinte, a lista de tarefas ainda por cumprir. Será que lhe correu bem o teste de música? A pêra que está no carro- quase que lhe sinto o sumo. Tenho a cara salgada. Vejo agora o sol de frente. Laranja. Passo novamente a ponte e chego. Tiro os fones. Passa pouco das 6 horas. As minhas pernas tremem. O resto do meu corpo emana alegria. Mando a mesma mensagem de sempre "Acabei. Quase a chegar". Os meus filhos perguntam-me "quantos quilômetros?" Os olhos deles são a minha medalha. 




2 comentários: